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O Irão e a Estrutura da Nova Ordem Mundial: A Emergência da Resistência Civilizacional

Tudo mudou no mundo desde 7 de Outubro de 2023. Tudo mudou, não só dentro das fronteiras da Palestina ocupada, mas também dentro da consciência global da humanidade. O bombardeamento de Gaza, o silêncio das instituições ocidentais e as contradições marcantes entre a retórica dos direitos humanos e a realidade no terreno abalaram a legitimidade moral do Ocidente.

Os meios de comunicação que há muito reproduziam a história sionista sem contestação foram subitamente confrontados com uma tempestade de questões públicas. De Londres e Nova Iorque a Joanesburgo e Jacarta, universidades, ruas e plataformas digitais tornaram-se palcos de um novo despertar. No meio destas mudanças, o nome Irão tornou-se mais proeminente do que nunca. Está atualmente no centro de um discurso global denominado “resistência civilizacional”.

Durante anos, o Ocidente retratou o Irão como um país “isolado”. Mas hoje permanece como o núcleo conceptual de um movimento que começou na Palestina, mas que transcende a geografia. Num mundo abalado por Gaza, a filosofia de resistência do Irão mudou de uma posição regional para uma exigência moral universal. Este é um apelo à redefinição do significado da justiça para além das fronteiras.

Filosofia da independência e resistência e seu crescimento

No pensamento iraniano, a resistência não é simplesmente uma reacção militar ou política. Está enraizado em tradições civilizacionais que ligam a liberdade à dignidade humana. Da sabedoria de Mulla Sadra à poesia de Hafez e Ferdowsi, da Revolução Constitucional à Revolução Islâmica, a tradição intelectual do Irão sempre conteve uma sensibilidade à “humilhação” e à “dominação”. Esta sensibilidade ressurge agora como base filosófica para a resistência civilizacional.

Para o Irão, a resistência não é simplesmente uma resposta a um inimigo, mas uma escolha moral, uma decisão de enfrentar a injustiça como uma obrigação ética. Esta visão do mundo contrasta fortemente com a lógica ocidental do poder, que vê a resistência como uma ameaça. O Irão entende a resistência como parte da sua identidade colectiva, uma expressão viva de uma civilização que considera os humanos como portadores de valores sagrados e não como instrumentos de poder.

Depois do 7 de Outubro, esta filosofia atravessou as fronteiras iranianas e tornou-se um discurso partilhado no Sul global. “Resistência é dignidade”, disseram estudantes no Cairo. Os activistas civis em Joanesburgo invocaram memórias do apartheid para compreender a luta palestina. Os meios de comunicação em Caracas descreveram o Irão como um “Estado que não se rendeu”. Estas reflexões mostram que a resistência já não é a resposta de uma única nação, mas uma linguagem partilhada entre pessoas que suportaram séculos de dominação e humilhação.

Nas últimas duas décadas, o Irão tem redefinido o próprio significado de poder. Enquanto o Ocidente mede a segurança em termos de acumulação de armas e alianças militares, o Irão define-a com duas palavras: defesa e dignidade. Este é o cerne do conceito de “defesa da dignidade” que distingue a filosofia de segurança da República Islâmica da busca de hegemonia do Ocidente.

O papel do Irão na formação de um “eixo de resistência” regional do Líbano ao Iémen deve ser entendido sob esta luz. O objectivo do Irão não é dominar outros países, mas sim manter o equilíbrio contra a coerção externa. Depois do 7 de Outubro, esta restrição adquiriu um novo significado. O ataque de Israel a Gaza não só desencadeou uma resposta armada do movimento de resistência, mas também revelou a realidade de que a arquitectura de segurança da região já não é unipolar. Através da sua presença estratégica, o Irão emergiu como a espinha dorsal moral e logística da frente anti-sionista. Isto não é motivado por um desejo de confronto, mas por um compromisso de defender a dignidade e a autodeterminação das pessoas oprimidas.

A diferença entre o Irão e o Ocidente reside na fonte de legitimidade. A legitimidade de Teerão não deriva da superioridade militar, mas da autoridade ética. A NATO equipara segurança a controlo, enquanto o Irão vê isso como justiça. É por isso que, na consciência colectiva da região, o poder do Irão é visto mais como protecção do que como ameaça. Esta é uma dupla dissuasão que combina capacidade militar e legitimidade moral.

Para além das mudanças políticas e de segurança, estão também em curso mudanças económicas mais profundas. O mundo está a afastar-se da ordem financeira unipolar ocidental e a aproximar-se de um sistema multipolar. Nesta transição, o Irão emergiu como um interveniente fundamental. A adesão formal à Organização de Cooperação de Xangai e a adesão aos BRICS marcam o regresso do Irão ao mapa económico global através de um caminho independente baseado na cooperação Sul-Sul, na desdolarização e na soberania financeira.

O discurso da resistência, outrora confinado ao campo de batalha, estende-se agora à esfera económica. O conceito de “resistência económica” do Irão desenvolveu-se num paradigma que vai ao encontro das aspirações de muitos países em desenvolvimento. Países como a Índia, o Brasil, a África do Sul e até a Arábia Saudita estão a tentar reduzir a sua dependência de instituições financeiras controladas pelo Ocidente. Depois de suportar décadas de sanções, o Irão representa agora um modelo de independência económica sob pressão – um modelo que ressoa em todo o Sul global.

Neste quadro, Teerão posiciona-se não apenas como um actor político, mas também como um símbolo de confiança económica. Do comércio com a China e a Rússia ao desenvolvimento de um corredor Norte-Sul e às parcerias com os seus vizinhos, o Irão está a traçar um novo caminho para o crescimento baseado na cooperação equitativa e na justiça económica, em vez do domínio das instituições ocidentais ou de empréstimos condicionais.

Guerra de Narrativas e o Poder Cultural do Irão

Talvez a mudança mais profunda depois do 7 de Outubro tenha ocorrido não no campo de batalha, mas na arena narrativa. No mundo actual, impulsionado pelos meios de comunicação social, a verdadeira guerra está para além do sentido. Pela primeira vez em décadas, as narrativas sionistas de “autodefesa” e “terrorismo” enfrentam uma onda de cepticismo global. Milhões de pessoas em todo o mundo desafiaram o monopólio da narrativa dos meios de comunicação ocidentais, amplificando as vozes e imagens palestinianas.

Neste contexto, o Irão desempenhou um papel central na formação da narrativa moral da resistência. Desde declarações oficiais a curtas-metragens, desde redes de comunicação social locais a expressões culturais, o Irão introduziu uma nova linguagem moral ao público em todo o mundo. Não glorifica nem nega a violência, mas coloca-a no quadro da dignidade humana e do direito à autodefesa.

Hoje, a influência cultural do Irão é visível de Teerão a Beirute, do Cairo a Caracas. Os estudantes das universidades americanas são inspirados por este discurso e vêem o colonialismo não como uma relíquia do passado, mas como uma ferida viva da humanidade moderna. Nas ruas de Londres e Paris, ouvem-se cânticos, reflectindo um vocabulário de resistência e não de propaganda ocidental. “A influência do Irão não é medida pelas armas, mas pelas palavras: o redespertar da consciência moral global.”

Esta dimensão suave do poder do Irão complementa o poder económico duro do Irão. Ao contrário dos modelos ocidentais de projeção cultural baseados na indústria do entretenimento, a influência iraniana opera através do significado nacional, da ética e da memória histórica. E são estas forças intelectuais e morais que estão a reorganizar a ordem mundial a partir de dentro.

O Irão participa na construção de uma nova ordem mundial baseada na independência, na justiça económica e na dignidade humana, combinando três dimensões de poder: filosófica, militar e cultural.

A resistência de hoje já não é de natureza palestina ou árabe; é universal. Da América Latina a África e em toda a Ásia, estão a surgir novos entendimentos de “liberdade responsável” que desafiam as lógicas de dominação. Nesta transformação, o Irão não é apenas uma nação, mas representa uma ideia, uma ideia nascida da história, da fé e da cultura, agora traduzida na linguagem da justiça em todo o mundo.

Num mundo onde as antigas potências perderam a sua legitimidade moral, a síntese da ética e da política do Irão, a sua fusão da razão e da fé, e a sua inspiração para os países do Sul Global estão a moldar o futuro. Este é um futuro onde as vozes silenciadas da história falam novamente com clareza e confiança.

De Teerão a Tunes, de Caracas à Cidade do Cabo, a filosofia da resistência encontrou a sua voz. E a voz fala persa.

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